Um de nós, Jorge Sampaio
Em Guimarães, aprendi a fidelidade às raízes,
de uma forma que me marcou desde muito jovem.
Jorge Sampaio
As raízes familiares de Jorge Sampaio, do lado paterno, estão em Guimarães. O seu avô, José Leite de Carvalho, nasceu em 1876, no lugar da Quintã, na freguesia de Mesão Frio. A avó, Emília de Sampaio Bastos, dez anos mais velha, veio da vila de Fafe, terra da sua mãe (o pai era de Sendim, Felgueiras). José e Emília casaram em outubro de 1902, em S. Paio de Vizela, onde a noiva residia. Instalaram-se em Gémeos, no casal do Ribeiro, onde lhes nasceram três filhos: Maria Amélia, em 1905, António, em 1908, e Irene, em 1910. Nos registos de batismo, o pai aparece como capitalista. Da vida pública de José Leite de Carvalho apenas sabemos que foi vice-presidente da Junta de Paróquia de Gémeos, após a instauração da República, e que, em agosto de 1911, foi um dos subscritores de um auto de solidariedade com a República, na sequência de atos contra os símbolos do novo regime.
O filho usaria o nome de António Arnaldo de Carvalho de Sampaio. Estudou no Liceu de Guimarães e na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, onde concluiu a licenciatura em 1933, a que se seguiu o mestrado em saúde pública na Universidade Johns Hopkins, nos EUA. Entretanto, em abril de 1937, casou com Fernanda Bensaúde Branco, assentando residência em Sintra. Deste casamento nascerão dois filhos, Jorge, em 1939, e Daniel, em 1946.
O vimaranense Arnaldo Sampaio foi defensor da saúde pública (dizia que “a pobreza gerava a doença e a doença provocava a pobreza”) e um dos médicos mais destacados do século XX. Professor catedrático, criou os Laboratórios de Bacteriologia e Virologia do Instituto Ricardo Jorge e o Centro Nacional da Gripe no Instituto Superior de Higiene, foi diretor da Escola Nacional de Saúde Pública e diretor-geral de saúde e concebeu os centros de saúde portugueses. Foi membro do Comité Executivo da Organização Mundial de Saúde. Mas nunca esqueceu as suas raízes. Segundo o seu filho Daniel, Arnaldo Sampaio “não dispensava visitas à sua terra natal (Guimarães), nem jamais esquecia o que tinha aprendido com os seus antepassados, pessoas de trabalho para quem a persistência e a honestidade eram valores fundamentais”.
O seu filho Jorge destacou-se como um dos mais brilhantes e influentes políticos portugueses do nosso tempo. Foi Presidente da República e exerceu funções internacionais de grande importância. Para a minha geração, Jorge Sampaio é o exemplo da nobreza da política, a que se devotou com humanismo, consciência social, empatia e ética republicana. Do pai, herdou a inteligência e o amor por Guimarães.
Jorge Sampaio não ocultava as suas emoções. Era um homem que chorava. Nunca lhe escutei um discurso em Guimarães que a voz não se lhe embargasse. Porque, como disse um dia:
“É sempre com emoção que visito Guimarães, revivendo memórias pessoais e retomando laços afetivos que me são caros.”
De Jorge Sampaio retenho o dia em que apareceu na Sociedade Martins Sarmento e, depois de dizer que “não é todos os dias que encontramos cidades com uma instituição cultural com a dinâmica e a importância da SMS”, condecorou Santos Simões; ou o notável discurso na abertura do centenário da morte de Martins Sarmento; ou o seu genuíno contentamento no dia em que Guimarães festejou o título de Património Mundial; ou o simbolismo de ter feito em Guimarães o último 10 de Junho a que presidiu.
Mas, lembro, acima de tudo, o seu papel na Capital Europeia da Cultura.
Quando todos percebíamos que se abeirava o desastre, Jorge Sampaio segurou o leme e evitou o naufrágio.
Com Jorge Sampaio, foi um de nós que partiu.
Não será esquecido.