Promotores imobiliários
Andava eu na minha indecisão habitual sobre o tema deste artigo, quando assisti à parte final de um debate a dois num noticiário televisivo sobre o eventual fim dos “vistos gold”. De um lado estava a Mariana Mortágua, do outro, um tal Hugo Santos-Ferreira. No momento assumi que seria um debate entre deputados, mas achei estranho que este último tenha afirmado com toda a convicção que “os problemas da habitação só se resolvem com mais oferta”.
A perguntar-me que deputado iria à televisão dizer tamanha barbaridade, fui pesquisar, e verifiquei que o Santos-Ferreira não tem assento na Assembleia da República, mas sim na presidência da Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários. Estava decidido, iria escrever sobre habitação.
Desde 2018 que existe em Portugal a denominada Nova Geração de Políticas de Habitação, que pretende alterar o paradigma da função do Estado nesta matéria. O objetivo declarado é alargar o âmbito dessas políticas de modo a garantir o acesso universal a uma habitação adequada. Para tal, foram criados programas que continuam a permitir dar resposta às famílias que vivem em situação de grave carência habitacional, mas também outros que possam garantir o acesso à habitação a todos os que não têm resposta por via do mercado.
É ainda declarado que essa mudança de paradigma implica passar de uma política de habitação cujos principais instrumentos assentaram na construção de novos alojamentos e no apoio à compra de casa para uma política que privilegia a reabilitação e o arrendamento, tornando a reabilitação na principal forma de intervenção no desenvolvimento urbano.
Nesta Nova Geração de Políticas de Habitação está prevista a elaboração da Estratégia Local de Habitação (ELH), que, com base na análise do diagnóstico das carências existentes, das características do território e da conjuntura socioeconómica do município, deve definir metas e objetivos para estabelecer um enquadramento estratégico e um modelo de intervenção em matéria de habitação que oriente e articule as políticas públicas de habitação e a atuação das entidades públicas e privadas.
Em Guimarães, como em quase todos os municípios, a ELH ficou aquém do seu propósito e mais não é que um inventário dos casos de condições indignas de habitabilidade, que constitui requisito obrigatório para aceder aos financiamentos do programa “1º Direito”.
A ELH de Guimarães precisa de muito mais. Precisa de objetivos claros e de planos para os concretizar. Precisa de cumprir o seu papel integrador de políticas sectoriais e impedir que o executivo municipal (na sua totalidade) ignore as diretrizes nacionais de política de habitação e de ordenamento do território, e alinhe com as convicções e pretensões dos promotores imobiliários.