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Robin dos Bosques (ao contrário)

Eduardo Fontão
Opinião \ segunda-feira, abril 17, 2023
© Direitos reservados
A medida, ao ser transversal a toda a população, com diferentes padrões de rendimento e de consumo, vai gastar recursos com quem não precisa, que poderiam ser canalizados para quem é mais necessitado.

No próximo dia 18 de abril, entra em vigor a aplicação da taxa de IVA zero a um cabaz de produtos alimentares considerados essenciais, que inclui diversos legumes, carne, peixe fresco e congelado.

A aprovação da medida, que irá vigorar até outubro, causou alguma surpresa, ao ser aprovada no Conselho de Ministros do passado dia 27 de março, depois de vários membros do Governo, entre eles o ministro das Finanças, o ministro da Economia e até mesmo o Primeiro-Ministro, terem feitos diversas declarações públicas onde se afirmavam totalmente contra a redução do IVA nos bens alimentares, como forma de combater a inflação.

Segundo as estimativas do governo, esta isenção de IVA (IVA zero) irá custar aproximadamente 500 milhões de euros aos cofres do Estado. Tenho poucas dúvidas de que será mais um enorme desperdício de dinheiros públicos.

Em primeiro lugar, porque mais uma vez, em vez de copiarmos os bons exemplos, copiamos o que já se provou não ter funcionado noutros países, que já aplicaram medidas similares num passado recente. Como é caso de Espanha, em que a redução do IVA foi engolida em 15 dias pelas variações dos preços.

Por acaso alguém se recorda de os preços na restauração terem baixado desde que o IVA baixou de 23% de 13%, em Julho de 2016? Não, pois não?

Pelo que o mais provável é que quem fique a ganhar com a medida sejam os diversos intervenientes no circuito económico, desde os produtores até aos supermercados.

Em segundo, porque o IVA é um imposto regressivo do ponto de vista do rendimento. Ou seja, sendo as taxas constantes (6%, 13% e 23% no Continente), quem consome mais, paga mais imposto de forma absoluta, mas percentualmente paga menos face ao seu rendimento. Para além de que os mais pobres, como poupam menos, despendem uma maior fatia do seu rendimento com o pagamento do IVA, quando comparados com os mais ricos. Pelo que é socialmente injusto, e até imoral na minha opinião, aprovar nestes tempos tão difíceis, uma medida que abrange todos de forma transversal.

Em terceiro lugar, porque a isenção tanto se vai aplicar ao atum em óleo de marca branca, que custa menos de um euro como ao atum em posta em azeite de marca premium, que custa quase 7 euros. Ou seja, quem consumir habitualmente o primeiro irá poupar seis cêntimos e quem consumir o segundo vai poupar 40 cêntimos. É uma espécie de Robin dos Bosques, só que ao contrário.

A medida, ao ser transversal a toda a população, que tem diferentes padrões de rendimento e de consumo, vai gastar recursos com quem não precisa, que poderiam ser canalizados para quem é mais necessitado.

Logo que a medida foi anunciada pelo Ministro das Finanças, dois reputados economistas (Susana Peralta, num artigo no jornal Público, e Miguel Faria e Castro, na rede social Twitter) fizeram as contas à poupança média de 12 euros anunciada, resultante da aplicação do IVA zero a um cabaz alimentar de 200 euros, fazendo-o através de diferentes metodologias de cálculo. Facilmente chegaram ambos à conclusão de que ficaria muito mais barato enviar-se um cheque às famílias carenciadas. Eu também fiz os meus cálculos: ora 12 euros, multiplicados por seis meses e por três milhões de pessoas (número aproximado de portugueses que tem direito a apoios sociais) só dá 216 milhões de euros. Portanto, em vez de baixar o IVA para zero, durante seis meses, cuja perda de receita será de aproximadamente 500 milhões de euros, era possível gastar os mesmos 500 milhões e apoiar os três milhões que efetivamente precisam, com 167 euros (500 milhões de euros a dividir por três milhões), quando assim só iremos eventualmente apoiá-los com 72 euros (12 euros x seis meses).

Há dias, em entrevista a um canal televisivo, um reputado professor de economia dizia que dificilmente algum economista no mundo concordaria que esta medida. Pois, mas os nossos governantes nem o “Economia para totós” leem. Só conhecem o “Economia para melhorar as sondagens e ganhar as próximas eleições”.

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