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Guimarães
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O que é Guimarães?

Francisco Brito
Opinião \ sábado, maio 01, 2021
© Direitos reservados
Guimarães talvez seja apenas uma vila que, com muito esforço, conseguiu ser cidade. E é bom que não se esqueça disso.

Resolvi fazer esta pergunta a mim mesmo ao ler um folheto antigo, de Camilo Castelo Branco, em que o escritor perguntava “Que é o Porto” e onde, com o seu habitual humor, respondia, entre outras coisas, que o Porto “é o dous e dous são quatro convertido no balcão do probo e honradíssimo bacalhoeiro em dous e dous são cinco”. Deixo o humor de molho e partilho desde já algumas linhas soltas que espero que contribuam para uma reflexão e para várias respostas a esta questão.

Embora tenha como símbolos o Castelo, o Paço dos Duques ou a Citânia de Briteiros, Guimarães, tal qual a conhecemos hoje, nasceu na segunda metade do século XIX. Tratava-se de uma vila pequena, mas já liberta dos grilhões medievais, cercada de dezenas de freguesias que com ela interagiam e que, na verdade, sempre foram o seu sustento (agrícola e industrial).

Este laborioso burgo conseguiu ao longo dos anos dotar-se de algumas associações, instituições e iniciativas que lhe atribuíram algumas características de uma pequena cidade. Refiro-me às escolas (Liceu de Guimarães), às bibliotecas, museus e escolas técnicas e exposições industriais (nascidas na Sociedade Martins Sarmento), ao teatro (materializado na edificação do Teatro D. Afonso Henriques), à assistência organizada em que à Misericórdia e Ordens Terceiras se vieram juntar as Associações de Socorros Mútuos (Artística Vimaranense, Bombeiros Voluntários e Associação Familiar Vimaranense), aos novos santuários (S. Torcato e Penha), à abertura de avenidas e a vários outros elementos que ajudaram a dar a Guimarães uma certa dimensão urbana.

O século XX, com tudo de novo e de bom que trouxe, constituiu uma continuidade e não uma ruptura com uma cidade que se afirmou como tal ainda no século XIX. Chegados ao século XXI encontramos alguns elementos de continuidade com o passado mas vemos pela primeira vez certos sinais de recuo.

Se é verdade que galardões, eventos e metas como a inscrição do centro histórico da cidade no Património Mundial da UNESCO (a que se deverá seguir a inscrição da Zona de Couros), a Capital Europeia da Cultura, a Cidade Europeia do Desporto, o estreitar de relações com a Universidade do Minho, a instalação da Universidade das Nações Unidas, o Bairro C, o Hereditas, ou as preocupações ambientais denotam uma firme capacidade de continuar a afirmar Guimarães como cidade moderna há, contudo, outros sinais que parecem indicar o contrário.

Guimarães tem perdido população (algo que nunca tinha acontecido nos últimos séculos e que não sucede nos principais concelhos vizinhos), deixou de ser a capital industrial do distrito (perda inédita que não resulta de nenhuma alternativa ou escolha intencional), tem vindo a vulgarizar a sua dimensão simbólica (são excessivas as permanentes referências a D. Afonso Henriques) e não raras vezes vê a sua zona histórica transformada num pastiche de outras cidades (promovendo o mesmo tipo de soluções e eventos).

Tudo isto faz Guimarães correr o risco de perder a sua urbanidade. Afinal há festivais em aldeias, há Universidades em pequenas cidades ou vilas e juro que uma vez vi uma “Noite Branca” anunciada em Pizzo, um vilarejo no sul de Itália com menos de 10 mil habitantes.

Serve isto para dizer que Guimarães talvez seja apenas uma vila que, com muito esforço, conseguiu ser cidade. E é bom que não se esqueça disso. 

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