Guimarães – o património verde que preservamos
Pois bem, reconhecendo o seu enorme valor, a ele temos que inequivocamente adicionar o contributo da população e da sociedade em geral, ao longo de inúmeras gerações, assim como a sua interação com o meio (social, económico e ambiental) que nos conduziu até aos presentes dias.
Estamos muito longe dos tempos em que as urbes se dissociavam claramente dos territórios rurais, moldando o individuo ao seu meio, os seus usos e tradições. No Minho, a continuidade de paisagem com casarios contínuos e minifúndio, resultado da demografia e do fim da lei dos morgadios (que tinha como benefício a proteção da propriedade), tornou-se um desafio importante de imaginação e inovação, para alem de inteligência, para quem implementa políticas de desenvolvimento territorial, em particular no domínio das áreas rurais.
“Assim, eu, de Portugal, esqueci o mau – e constantemente penso nas belas estradas do Minho, nas aldeolas brancas e frias – e frias! – no bom vinho verde que eleva a alma, nos castanheiros cheios de pássaros, que se curvam e se roçam por cima do alpendre do ferrador…”
Se longe vão os tempos das aldeias brancas, muito adulteradas por ausência de planeamento (e gosto), ou a interpretação queirosiana do espaço rural como espaço de redenção para a pátria, espaço de regresso às origens portuguesas, não deixa o meio rural de ter, hoje, particular relevância como guardião de segurança alimentar e um papel de protagonista ambiental e paisagístico.
Acompanhem-me os leitores num exemplo (será o primeiro) oriundo deste nosso espaço geográfico, anteriormente com fronteiras mais amplas, e numa das produções mais ancestrais que tanta influencia provocou na nossa região e, mesmo, fora desta. Refiro-me à produção de animais bovinos de raça Barrosã, um dos mais importantes patrimónios genéticos nacionais.
Ora, em tempos idos estes animais eram utilizados (em juntas) para trabalho e carne. Para poderem melhor lavrar os campos, de forma mais dócil, eram castrados e, após a sua utilização, ensebados (engordados) para carne. Era um momento de celebração para os agricultores pois, mercavam-se as arrobas em peso pelas libras ou arrecadas que luziam as lavradeiras nas suas orelhas ou os fios ao pescoço. E, neste momento, já valorizamos a produção nacional e a segurança alimentar, o comércio externo (muitos destes bois exportados do Porto para Inglaterra, dando origem ao célebre Portuguese Beef), a indústria da ourivesaria (estabelecida em Guimarães e nos concelhos vizinhos) e, não menos importante, a felicidade das Mulheres Minhotas e, em particular, as lavradeiras vimaranenses.
Deu, ainda, um forte impulso às indústrias de curtumes, de cutelaria, às tradições e romarias, à conservação da paisagem, ao orgulho de viver num espaço rural. Passado??? Claro que não, dizem os portugueses que reservam mesa num conhecido Assador de Jiménez de Jamuz - Léon para se deleitarem (como dizia Eça) com a carne maturada de um bom bife proveniente de …. Guimarães.
Nota: Artigo publicado originalmente na edição 1 do Jornal de Guimarães em Revista, em abril 2021.