Eu me declaro... circunforâneo
No passado dia 26 de setembro, o país voltou às urnas para decidir sobre quem iria liderar os destinos dos seus 308 municípios e 3091 freguesias nos próximos quatro anos. Se dúvidas houvesse sobre
quem foi o vencedor das eleições, depois do PS ter perdido 12 autarquias, e do PSD ter ganhado 16, de
entre as quais Lisboa, Coimbra, Portalegre e Funchal, estas foram totalmente dissipadas pelo primeiro–ministro no Parlamento.
Questionado pelo “nosso” deputado André Coelho Lima - a quem aproveito para agradecer o contributo
para o alargamento do meu capital lexical - sobre se seria digno do cargo de Primeiro-Ministro, atuar como um verdadeiro circunforâneo, apregoando pelo país fora os “dinheiros” do PRR, como se os mesmos fossem propriedade do partido do governo, António Costa apresentou-se de cabeça perdida: deixou transparecer um enorme incómodo ao ser confrontado com uma estratégia eleitoral eticamente duvidosa, que assim foi vista pelos eleitores e que mais prejudicou do que ajudou os candidatos do seu partido às autarquias, e respondeu com uma intervenção a roçar a má educação, num tom impróprio para a casa da
democracia e para responder a um deputado eleito pelo povo.
António Costa pode ter apresentado inúmeras propostas válidas para o país na campanha eleitoral para as
autárquicas, mas a mensagem que realmente passou para os eleitores foi que vem aí um camião de notas da UE que vai ser a solução para todos os problemas do país e que os autarcas do seu partido eram os melhor preparados para o gastar.
Admito que não estou muito confiante de que o PRR vá resolver os problemas estruturais da nossa economia. Portugal recebe fundos estruturais da UE desde a adesão, em 1986. Os enormes pacotes financeiros que Portugal tem recebido desde então têm sido muito importantes para o desenvolvimento do país e durante algum tempo fizeram com que Portugal convergisse, em termos de rendimento, para a média da União. Contudo, nos últimos anos, mesmo continuando a receber estes enormes fluxos de capital, Portugal não tem conseguido crescer ao mesmo ritmo dos seus parceiros, tem-se afastado da média da União Europeia e já foi ultrapassado por praticamente todos os países do Leste. A economia portuguesa parece estar numa encruzilhada, com um modelo económico esgotado e incapaz de gerar um crescimento sustentado.
O que nos leva à conclusão, já várias vezes comprovada, de que atirar dinheiro para cima dos problemas normalmente não os resolve. Mais: por vezes o dinheiro fácil leva a que se façam investimentos
desnecessários e cujos custos vem a ultrapassar largamente o valor dos subsídios recebidos. Os fundos do PRR podem contribuir de forma crucial para o desenvolvimento do nosso país se forem gastos com parcimónia, em investimentos estruturantes, que gerem utilidade e rendimentos no futuro. Não faltam
exemplos da utilização de fundos europeus em diversos projetos -
verdadeiros “elefantes brancos” - que se revelaram deficitários e cujos prejuízos ainda hoje estão a
ser pagos pelos contribuintes.
Quanto aos resultados no nosso município: cada vez que há eleições para as autárquicas, ao analisar os resultados eleitorais de Guimarães, vem-me sempre à memória a célebre frase do ex-internacional
inglês Gary Lineker, após a eliminação da Inglaterra no Itália 90: “O futebol é um jogo simples, são 11 de cada lado e no final ganha a Alemanha”.
A votação que sem dúvida me gerou maior interesse foi para a Assembleia Municipal. Mantendo-me na gíria futebolística, fiquei na dúvida se os candidatos do PS e do PSD estiveram a jogar uma partida
da Legends Cup ou um encontro de pré-epoca.
Espero sinceramente que tenha sido a segunda e que a próxima não volte a ser a feijões.