Couros: o próximo Património Mundial em Guimarães
Guimarães tem muitos tesouros. O Centro Histórico classificado é um deles. Mas há mais. Uns mais conhecidos do que outros. Ali bem perto, a Zona de Couros, abraçada pela Alameda S. Dâmaso, Campo da Feira, Av. D. João IV, CCVF e Teatro Jordão, acolhe a história da indústria de curtumes que, onde quer que se encontre localizada, está e estará sempre ligada à história da Humanidade. Aliás, não é possível falarmos de curtumes sem que nos ocorra imediatamente a imagem do Homem primitivo, protegido com peles, que utilizava para o seu agasalho…
Em Guimarães, o que vemos hoje são vestígios de uma atividade com cerca de mil anos, algo que não se conhece existir na Europa e, provavelmente, no Mundo! Já no século XII, há cerca de 900 anos, portanto, encontram-se referências ao “Rio de Couros” em documentos de compra e venda de propriedades, o que demonstra a sua antiguidade. Desde então, mais de duas dezenas de antigas oficinas e fábricas de curtumes povoam a Zona de Couros onde a proliferação de tanques são o testemunho mais óbvio e mais visível de uma indústria que já foi a mais importante de Guimarães.
Estávamos em 1884. Prevalecia a tão afamada Exposição Industrial, o motor de aceleração da transição industrial que permitiu a implantação da indústria têxtil algodoeira, tal como hoje a conhecemos. O advento da revolução industrial foi determinante e a História tratou de honrar os Curtidores e Surradores da Zona de Couros – os mesmos pioneiros que impulsionaram a realização da Grande Peregrinação à Penha, a pé, sempre no segundo domingo de setembro e sempre com o histórico estandarte onde está inscrito o lema que os caracteriza: “Fé, Trabalho e Honra”.
Couros é tradição. É indústria. É cultura. É, hoje, local de conhecimento. É história. E é futuro. Proteger e conquistar um regime de proteção é cuidar desta pérola de Guimarães. Em 2013, logo após ter tomado posse como Presidente de Câmara, Domingos Bragança formalizou o desejo de alargar a classificação da UNESCO à Zona de Couros. Três anos depois, em 2016, a Comissão Nacional da UNESCO decidiu incluir a candidatura de Guimarães na Lista Indicativa de Portugal a Património Mundial. Mais um passo tinha sido dado numa longa e dura caminhada, a fazer lembrar a anual peregrinação de fé do segundo domingo de setembro.
Esta semana, deu-se outro passo! Importante, muito importante. A publicação em Diário da República do aval para o avanço da classificação definitiva de Couros como “Monumento Nacional” é uma condição fundamental para que seja bem-sucedida a candidatura à UNESCO do alargamento do título de Património Cultural da Humanidade. Até ao final do ano, esta nova fase de classificação deverá estar concluída, o que permitirá depois avançar para a candidatura definitiva de Couros à prestigiada UNESCO. Por outras palavras, o processo só continuará a avançar, depois da publicação definitiva da classificação do Bem como “Monumento Nacional”.
A caminhada é longa. Mas vamos lá chegar. Guimarães tem argumentos fortes, muito fortes. É aparentemente ousada a proposta de duplicação da área de Património Mundial. Mas é, ainda mais, justa pelo que contempla e realça: a inter-relação entre as diferentes camadas sociais, económicas, históricas, antropológicas, que definem e conformam um lugar e, em grande medida, uma forma de ser. Aliás, em Portugal, é a primeira vez que se decide avançar com uma candidatura para proteger um conjunto de arqueologia industrial. Os tanques de Couros, o sistema hídrico e a história do trabalho são os elementos essenciais a classificar.
O Município de Guimarães tem investido na recuperação e reconversão da Zona de Couros, apostando no reforço da formação, do conhecimento e da inovação. Foi lá que esteve o Cybercentro. É lá que está a Universidade das Nações Unidas, o Ciência Viva, o Instituto de Design, a Fraterna ou a Pousada da Juventude, cujo edifício pertenceu ao “Cidade”, alcunha dada a Cristóvão da Silva (1812-1883), por ser, na altura, proprietário de quase… meia cidade! Mas, em Couros, é lá que está também a Cátia, o Sr. Martins, a D. Ana, o Sr. Fontão, a D. Henriqueta ou o Tio Júlio, dos tão famosos pregos.
E há muito mais a descobrir, em Couros. Não é só o passado e a antiguidade. É o futuro. É o cuidado com o ambiente. É a necessidade da limpeza das linhas de água, em especial, também, do rio de Couros – o rio que atravessa a cidade de Guimarães! A candidatura ousa elevar à categoria de Património Mundial outros espaços anónimos: os lugares primitivos do Trabalho. Do qual, em tempos, dependeu a sua economia e o seu crescimento. E que enobrece o passado de uma civilização e de uma comunidade laboriosa. Como são as gentes de Guimarães…