Consumidor final
Às vezes parece que se tenta imputar ao indivíduo uma responsabilidade maior do que alguma vez poderia ter na realidade. Como se a salvação do mundo dependesse inteiramente deste desgraçado. Cobra-se-lhe tudo, exige-se-lhe quanto se pode, e ainda acaba chantageado pelos ajustes que devia fazer em prol do planeta, seja ao nível do consumo de água, energia, combustíveis, ou reciclagem do lixo.
Como se produtos e mercados que possam colocar em causa a sustentabilidade e a saúde do globo não devessem ser estruturalmente planeados. Preparados para uma utilização eficiente e devidamente incentivada por uma relação justa de custo-benefício, salvando assim, com facilidade, o planeta. Em vez disso, vive-se da cartada colorida do mundo maravilhoso que se quer promover à custa dos sacrifícios que alguns talvez façam para que todos beneficiem, mas sem regras – simplesmente boas sensações.
A este consumidor cobram-se estadias em hotéis, contemplando no preço o custo da mudança diária dos lençóis – do trabalho, da água e dos detergentes necessários para os lavar e substituir, – sendo depois deixada a recomendação, muitas vezes via bilhete pousado em cima da cama, de que não deve solicitar essa mudança a não ser que seja mesmo preciso, pensando no planeta azul, que passaria melhor. Ora, parece-me fantástico que alguém esteja disposto a ceder o extremo luxo de dormir numa cama lavada diariamente por um mundo melhor, mas a questão devia passar sempre por uma relação de custo-benefício – se, de facto, o planeta passaria melhor e seria vantajoso reduzir a quantidade de lençóis lavados por dia, então esse serviço devia ser cobrado pelo valor real que representa, diminuindo assim a procura, como apregoam ser necessário. Talvez devesse sair do custo da estadia e cobrado como extra a quem o solicitasse. Mas por que haveria de ser o indivíduo, vítima desta chantagem moral, o responsável por esse financiamento do planeta feliz? Por que haveria de ser responsabilizado por algo sobre o qual não exerce impacto nenhum, quando o problema, se é que existe nos termos em que lhe é apresentado, se atenuaria imediatamente com a aplicação de medidas diretas? Não parece ser reconhecido como urgente, sendo deixado ao critério do consumidor final a decisão de salvar, ou não, o planeta, a cada bela noite de sono em lençóis acabados de lavar de três ou quatro dias. Fica a sensação de que talvez seja um problema de excessiva relevância para alguma minoria, instrumentalizado pela comunidade hoteleira como forma de baixar custos e aumentar lucros enquanto faz o papel de bom samaritano da sustentabilidade.
Se há necessidades que exigem a ação das pessoas pelo bem do pedaço de terra onde vivemos, e a capacidade da sua voluntária intervenção é tida como relevante num contexto moderado e de bom senso, que sejam promovidas e incentivadas de forma justa e equilibrada. Valorize-se essa ação, tornando-a motivadora para todos. O problema é que, quando falamos da sustentabilidade do planeta, as coisas tornam-se enviesadas, políticas, negócio, agarradas a moralismos e posições extremadas, e por isso não fazemos mais nada para além de falar