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Uma biblioteca com muitas bibliotecas dentro: a Biblioteca da SMS

Francisco Brito
Opinião \ segunda-feira, outubro 16, 2023
© Direitos reservados
Ao longo dos anos foram vários os particulares que doaram alguns livros ou bibliotecas inteiras à SMS. Teófilo Braga, Antero de Quental ou João de Deus são apenas alguns dos nomes.

A propósito do programa “Visita Guiada” sobre a Sociedade Martins Sarmento tive a oportunidade de revisitar a Biblioteca da Sociedade Martins Sarmento (BSMS) e de fazer algumas pesquisas relativas à proveniência dos seus livros.

Como acontece com algumas grandes bibliotecas, a BSMS acolhe no seu seio outras bibliotecas. Ao longo dos anos foram vários os particulares que doaram alguns livros ou bibliotecas inteiras à SMS. Teófilo Braga, Antero de Quental ou João de Deus são apenas alguns dos nomes que, no final do século XIX, se juntaram a uma extensa lista de doadores nacionais e estrangeiros que contribuíram para o enriquecimento da BSMS. O catálogo da “Biblioteca Pública de Guimarães” (que na altura era a BSMS) publicado em 1888 contém a indicação das pessoas e entidades que desde a fundação da Sociedade Martins Sarmento (em 1881) até 1888 doaram livros à biblioteca. Nessa publicação podemos encontrar a descritos 9104 títulos, fruto da oferta de um ou de vários exemplares por diversas figuras do panorama cultural português de então, bem como de vários vimaranenses que decidiram contribuir para a criação da BSMS.

A estas pequenas mas importantes doações juntam-se compras e ofertas de bibliotecas inteiras. Desde a fundação da Sociedade até à edição do já referido Catálogo, os Condes de Vila Pouca deram grande parte dos livros da sua grande biblioteca (rica em livro antigo e em militaria) à SMS. Francisco Martins Sarmento foi naturalmente um dos principais responsáveis pelo engrandecimento da biblioteca e, desde cedo, fez generosas doações à biblioteca da instituição criada em sua homenagem. Em 1886 morre o grande advogado e bibliófilo Bento António de Oliveira Cardoso. Jurisconsulto reputado e respeitado em todo o país pela sua sabedoria e integridade, movia-se nos Tribunais com um à vontade só igualado pela facilidade com que enriquecia a sua “vasta livraria, pois não se coibia de bater à porta de outros bibliófilos e de comprar em leilão livros arrolados em inventários judiciais... De acordo com Inocêncio Francisco da Silva (autor do Dicionário Bibliográfico Português), foi assim que Bento Cardoso, homem de “copiosa e variada erudição em todos os ramos da literatura”, reuniu “numerosa livraria, que encerra preciosos tesouros, e passa por ser, em número e qualidade dos volumes, uma das melhores bibliotecas particulares da província do Minho”. Quando morreu, os seus herdeiros elaboraram um catálogo da biblioteca e puseram-na à disposição dos interessados. A Sociedade Martins Sarmento não deixou escapar a oportunidade e adquiriu grande parte da biblioteca deste célebre causídico que, ao que parece, incluía a primeira edição de “Os Lusíadas” que hoje faz parte do espólio da SMS.

Pouco tempo depois, em 1887, Domingos Ribeiro Martins da Costa, empresário vimaranense estabelecido em Lisboa, ofereceu à BSMS mais de 2000 títulos de “obras teatrais”. A proveniência deste espólio é importante: trata-se da biblioteca de teatro do Conde de Farrobo. De acordo com os relatos da época, incluía “todas as comédias e dramas franceses representados em Paris desde 1818 a 1868”. Segundo creio, esta informação estava perdida numa notícia de jornal e só agora foi reencontrada constituindo por isso uma interessante novidade.

Nas primeiras décadas do século XX a BSMS cumpria plenamente a sua missão. Através de pequenas e de grandes doações caminhava a largos passos para os 100 000 volumes que hoje alberga. E era já um espaço que a todos interessava pois, para além de contribuir para complementar a “instrução popular” (através do empréstimo de livros), era uma biblioteca científica/académica (com particular destaque para a arqueologia) e também uma biblioteca que fazia parte do roteiro dos bibliófilos (como se percebe nas referências à BSMS feitas por António Joaquim Anselmo na sua “Bibliografia das obras impressas em Portugal no século XVI”, publicada em 1926).   

Os séculos XX e XXI continuaram a trazer importantes bibliotecas e arquivos à SMS. A biblioteca de Raul Brandão, os manuscritos de João Lopes de Faria, os espólios das Casas de Pousada e do Costeado, a notável coleção de Ex-Libris do Dr. Carlos Villas-Boas, são apenas alguns exemplos que se juntam a muitos outros livros e bibliotecas que, dentro da Biblioteca da Sociedade Martins Sarmento, contam a sua própria história. 

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