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Um primeiro lampejo

Francisco Brito
Opinião \ terça-feira, abril 02, 2024
© Direitos reservados
Ao que tudo indica foi no Teatro D. Afonso Henriques, em 1885, que pela primeira vez uma luz eléctrica se acendeu em Guimarães.

Como é sabido, foi pela mão do empresário Bernardino Jordão (1888- 1940) que  Guimarães passou a ter um fornecimento regular de electricidade. Desde 1901 que a concessão do negócio da electricidade estava nas mãos de empresários ingleses. Contudo, entre 1901 e 1908 a companhia britânica que detinha os direitos de exploração da electricidade na cidade nunca conseguiu dar resposta ao que lhe era exigido. Muito embora uma parte da iluminação pública da cidade já fosse feita por luz eléctrica, os resultados não eram muito animadores.  E nas casas e estabelecimentos particulares a iluminação continuava a ser feita através de gás, petróleo e outros produtos similares.  Em 1908 Jordão ganhou a concessão da electricidade e em 1909 a sua empresa começou a dar os primeiros passos no sentido de garantir aos vimaranenses a iluminação pública e particular bem como o fornecimento de electricidade às casas e empresas.

Antes da luz eléctrica conquistar as ruas e as casas de Guimarães um primeiro lampejo fez-se sentir no Teatro D. Afonso Henriques. Corria o ano de 1885 e a “troupe Ancilotti” prometia apresentar “os seus melhores trabalhos” e um teatro “iluminado a luz electrica”. O periódico “Religião & Pátria” de 16.05.1885 anunciou em primeira mão a novidade e os seus jornalistas foram convidados a assistir ao espectáculo. O repertório da “troupe Ancilotti” consistia num conjunto de números circenses e bizarros. Aos clássicos e aplaudidos números de velocípedes e trapézios juntou-se um “aquarium com a mulher peixe”, um número algo bizarro “que pela novidade também mereceu aplausos”. Mas um dos grandes actrativos da noite, a iluminação a luz eléctrica, desiludiu. De acordo com o relato do “Religião & Pátria”, “a luz não se projectava por modo nenhum, parecendo antes os pálidos reflexos de uma lâmpada sem óleo do que os clarões vividos de um foco de luz eléctrica”. O público ficou desiludido pois a falha da experiência não só privou os espectadores de conhecer a novidade tecnológica, mas também os impediu de ver “os quadros dissolventes”, um outro número apresentado por esta excêntrica troupe que, ao que parece, necessitava de uma luz forte para fazer efeito.

O líder da “troupe”, o Sr. Ancilotti tentou justificar a falha com problemas técnicos e chamou os jornalistas para uma nova experiência no dia seguinte. Mas não convenceu. Aos jornalistas não lhe pareceu que a “cousa tivesse melhorado muito [pois] o foco mais claro continuava a ser pouco intenso (…) e a luz tíbia e frouxa (…)”. Ancilotti, mostrando ser um profissional brioso, prometeu chamar um técnico para lidar com a teimosa máquina “Blekeman” e mostrar aos vimaramenses o que era a luz eléctrica.

Não sabemos se Ancilotti conseguiu arranjar a sua máquina e mostrar ao seu público as maravilhas da luz eléctrica. Sabemos apenas que em Guimarães, ao que tudo indica, o primeiro lampejo de luz movido por esta nova tecnologia terá tido lugar no teatro.

Curiosamente, cerca de 50 anos depois, os ganhos obtidos com a exploração da luz eléctrica permitiram a Bernardino Jordão fundar um teatro. Mas essa é uma outra história…

 

* Texto escrito segundo o antigo Acordo Ortográfico

 

Religião & Pátria de 16.06.1885  Fonte: Sociedade Martins Sarmento

Religião & Pátria de 16.06.1885 Fonte: Sociedade Martins Sarmento

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