Um poucochinho já chega
Depois de ter preparado um orçamento eleitoralista, aparentemente dá muito a muita gente, o Governo do PSD/CDS parece ter recebido um balão de oxigénio do Partido Socialista para esta legislatura. Estes desenvolvimentos merecem alguma reflexão.
Em primeiro lugar, apesar deste orçamento ter acudido a algumas classes profissionais que estavam zangadas, como os professores e polícias, deixa de lado a maioria dos trabalhadores. Quer no privado quer no público, as perspetivas de melhorias salariais são praticamente inexistentes. As atualizações serão em linha com a inflação, à exceção dos escalões mais baixos, o que fará com que a grande maioria dos trabalhadores continue sem recuperar poder de compra.
Em termos de impostos, depois da retirada de uma parte substancial da medida do IRS jovem, que até acabaria por ser declarada inconstitucional, mantém-se uma borla fiscal mesmo às pessoas com maiores rendimentos. Os jogadores de futebol com salários milionários agradecem. Também no IRC há borlas fiscais que as grandes empresas da banca, eletricidade, telecomunicações e retalho agradecem.
Esta redução nas receitas do orçamento terá naturalmente impacto na necessária redução da despesa. Daí que tenha sido anunciado o regresso da regra um por um na administração pública. Esta medida continuará a estrangular os serviços públicos, sem pessoas não é possível garantir acesso e qualidade. Com várias áreas a necessitar de investimento, seja nas escolas ou nos cuidados de saúde, impossibilitar o aumento de funcionários fará com que continue a ser muito difícil responder às necessidades das populações.
De fora deste documento continuam as medidas que resolvem os problemas das pessoas. No caso da habitação, a obsessão com o alojamento local e com os vistos gold manterá o aumento exorbitante dos preços e a escassez de casas que as pessoas possam pagar. Para os jovens, a redução de impostos na compra continua sem resolver o problema. Um empréstimo de duzentos mil euros representa uma prestação mensal de cerca de 800 euros, incomportável para a maioria dos salários recebidos pelos jovens.
Por tudo isto, à esquerda, este orçamento deve ser rejeitado. Por isso, não se percebe o sentido de voto do PS anunciado por Pedro Nuno Santos. A alternativa à esquerda deve ser construída através de um programa que valorize os trabalhadores e os direitos sociais. Como se viu no congresso do PSD, deste fim de semana, o conteúdo programático deste governo é poucochinho e decalcado do da extrema-direita, seja na visão securitária da imigração e, agora, também no combate à igualdade de género nas escolas. Luís Montenegro quer jogar nos dois tabuleiros e Pedro Nuno Santos não parece incomodado em ser peão.