Sabroso, 1958. Inimigo às portas?
“And this brings the question, who destroyed Sabroso I? With its northern entrance throughly wrecked, and the multiple damage to its wall, its fate seems worse than local tribal warfare could inflict.”*
* Christopher Hawkes, 1971, Northwestern Castros: Excavation, Archaeology and History, p. 285.
Depois da pequena campanha de escavação arqueológica que coordenou no Castro de Sabroso, nos inícios de Abril de 1958, o arqueólogo britânico Christopher Hawkes delineou uma proposta de evolução histórica deste castro de Guimarães, tendo sido o primeiro a elaborar um faseamento cronológico concreto. Embora os métodos seguidos na campanha, coordenada com a Sociedade Martins Sarmento, tenham sido marcadamente inovadores, a interpretação era, ainda, e ao gosto da época, pontuada pelos acontecimentos históricos mencionados nas fontes escritas da Antiguidade.
Não foi Hawkes quem primeiramente associou Sabroso à expedição romana comandada pelo Procônsul Décimo Júnio Bruto, em 137 a. C., posto que já Sarmento havia colocado o Bruto “Galaico” por estas bandas, explicando com ele o que lhe pareciam evidentes indícios de destruição do castro nesses recuados tempos. Convém relembrar o profundo desconhecimento deste território por parte dos então responsáveis hispânicos da República romana, entre os quais Bruto. Teriam sido os primeiros contactos, então ainda exploratórios.
Olhando para o aparelho harmonioso e orgânico da muralha do castro - por entre cujos blocos graníticos se não consegue passar uma folha de papel - Hawkes não deixou de reparar como estas fiadas de pedras poligonais se sobrepunham a uma face mais antiga da muralha, sugerindo a sua eventual reconstrução. Assim foi, de facto. Porém, para Hawkes, esta reconstrução terá sido precedida de uma destruição, não explicável pela “local tribal warfare”, as pequenas escaramuças entre diferentes comunidades castrejas. O arqueólogo britânico imaginou assim as catapultas de Bruto a danificarem seriamente a possante muralha de Sabroso, reconstruída depois, com particular mestria, por pedreiros locais, em reocupação posterior à expedição romana.
Ora, se isto é uma possibilidade, de facto, é. Mas se a reconstrução da muralha foi antecedida por uma destruição, fosse natural ou por ação humana, já é mais difícil de demonstrar. Pode também explicar-se com uma simples acção de embelezamento ou monumentalização do espaço, posto que, em simultâneo com esta reforma da muralha, temos a construção das casas de habitação mais sumptuosas do castro, das quais se recolheram impressivos elementos decorados.
Esta sequência, que revela um trabalho mais artístico sobreposto a uma muralha mais fruste, é particularmente visível na porta Norte do reduto, que parece ter tido um pano de muro a protegê-la a partir do exterior, e que foi estudada com algum detalhe pelo arqueólogo britânico. Aqui se evidencia como a alegada reconstrução, ou monumentalização da muralha, talvez ocorrida em inícios do século I a. C., inutilizou a porta, que foi entaipada, fosse por estar localizada num ponto de frágil defesa, fosse por a sua existência já não se justificar no contexto da reorganização interior do povoado.
A antiga porta Norte da muralha é um dos pontos altos da visita ao Castro de Sabroso, em São Lourenço de Sande, que esperamos ser possível a partir do próximo verão. Por agora, os arqueólogos e conservadores da Era têm vindo a limpar, estudar e conservar o que resta do monumento, numa intervenção promovida pelo Município de Guimarães, cofinanciada pelo Norte2020.