(À colação do) Dia Mundial do Teatro
27 de março de 1961 marca a data de institucionalização do Dia Mundial do Teatro pelo Instituto Internacional de Teatro, no decurso do seu nono Congresso, em Viena.
De facto, coincidindo com o aniversário de Atenas, na pátria e berço do teatro ocidental, esta efeméride instituída aquando da inauguração do Teatro das Nações, em Paris, tem ao longo destas últimas décadas contribuído indelevelmente para recordar o papel importante desta arte milenar e forma de expressão como fonte de divertimento, informação, inspiração e educação humana.
Porém, como afirma Augusto Boal, “o teatro não pode ser apenas evento – é forma de vida!”
Assim, da tragédia à tragicomédia, melodrama à revista, comédia ou drama, farsa ao teatro infantil, o teatro assume-se nos seus diversos (sub)géneros como o palco da vida, na qual atores somos todos nós, ainda que nem sempre usemos a máscara transformadora ou apenas a usemos em tempos de pandemias.
Efetivamente, remontando aos tempos primitivos, a representação (teatral) sempre participou da existência humana como necessidade de comunicação e/ou homenagem aos deuses, ora retratando o sofrimento humano, a luta contra a fatalidade e as causas nobres ora satirizando os excessos, a falsidade e a mesquinharia.
Com efeito, desde o ditirambo de homenagem ao deus Dionísio (deus do vinho) à catarse das tragédias dos gregos Sófocles, Ésquilo e Eurípedes e do romano Séneca, até às comédias do grego Aristófanes e dos romanos Plauto e Terêncio, que fazer rir e/ou chorar é uma das prerrogativas desta arte secular, que para além da máxima vicentina “ridendo castigat mores” (a rir se corrigem os costumes), visa essencialmente refletir e reagir sobre a vida e a sociedade.
Deste modo, desde os mestres mais antigos como Shakespeare ou Moliére, até aos mais atuais como Pirandello, Sartre, Camus ou Arthur Miller e ainda autores como Ibsen, Strindberg, Pinter e Beckett, ou os russos Gorki e Tchekhóv, entre muitos outros, o teatro sempre tem feito jus à asserção de William Hazlitt de que “o homem é um animal que finge – e nunca é tão autêntico como quando interpreta um papel”.
Em Portugal, o nosso (suposto) conterrâneo Gil Vicente, cuja peça teatral “O Auto da Visitação” ou “Monólogo do Vaqueiro” (1502) tem sido assumida como o primeiro texto dramático nacional, é considerado consensualmente o pai do teatro português.
Assim, além de berço da nação, Guimarães está intrinsecamente ligado ao teatro português, recordado no “Monumento aos 500 anos do Teatro Português e a Gil Vicente”, numa homenagem promovida pela Sociedade Martins Sarmento e Santos Simões, em 8 de Junho de 2003, aquando das comemorações do quinto centenário da primeira peça vicentina.
Recorde-se aliás que o dia 08 de Junho foi o feriado municipal de Guimarães até 1951, de acordo com a deliberação camarária de 15 de Janeiro de 1913.
Porém, neste ano de 2023, o teatro está na ribalta em Guimarães (e oxalá se lembrem disso aquando dos habituais Festivais Gil Vicente). De facto, “A Farsa de Inês Pereira” de Gil Vicente faz 500 anos e celebra-se o centenário de “Teatro” de Raul Brandão, publicação que engloba a trilogia de peças “O Rei Imaginário”, “O Gebo e a Sombra” e “O Doido e a Morte”.
De facto, já lá vão 500 anos que mestre Gil Vicente apresentou no Convento de Tomar, ao rei D. João III, a “farsa de folgar” intitulada “Farsa de Inês Pereira”. Uma peça de carácter profano com texto breve e em verso, que, numa intriga simples de crítica social e de sátira de costumes, retrata situações do quotidiano, de forma cómica e satírica.
Ora, a “Farsa de Inês Pereira” resulta do mote “mais quero asno me leve, que cavalo que me derrube”, que terá sido sugerido a Gil Vicente por alguns dos seus detratores, que duvidavam da sua criatividade literária e o desafiariam a responder a este repto.