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Obras de Santa Engrácia

Sara Martins Silva
Opinião \ domingo, junho 20, 2021
© Direitos reservados
Cada dia em que uma obra pública dificulta o acesso a um comércio é um dia em que o Estado perde receita.

Já sabemos que ano de eleições é sinónimo de obras e buracos em toda a parte. Se por um lado é verdade que o procedimento de contratação pública no nosso país é um calvário (criado para prevenir a corrupção, sem o fazer) que pode demorar demasiado tempo, a verdade é que não demora 4 anos, pelo que a concentração de obras nos anos eleitorais continua a ser a estratégia de quem acha que governação pública se resume a alcatrão e cimento.

E se o timing das obras públicas é questionável, o tempo que as mesmas demoram é absolutamente inaceitável. Na época em que a China constrói um hospital com mil camas em 10 dias, cá pelo burgo as obras, para arranjo de uma estrada, demoram mais de um ano. Na Era em que a sonda Perserverance percorreu os 480 milhões de km, que separam o nosso planeta de Marte, em 7 meses, a Câmara Municipal de Guimarães demora o mesmo tempo a requalificar uma alameda com algumas centenas de metros.

Não querendo comparar a capacidade económica e tecnológica da NASA ou da China com a nossa realidade, a verdade é que este arrastar das obras públicas não é explicável pelo atraso tecnológico. Não é incomum vermos as obras públicas sem trabalhadores durante vários dias, o que nos leva a concluir que o arrastar da duração dos trabalhos, e das suas implicações na vida dos cidadãos, ocorrem ou por mau planeamento, ou por vontade/estratégia política.

Certamente que nós não aceitaríamos que as obras nas nossas casas, ou nas nossas empresas, se arrastassem para lá do que é aceitável, até porque cada dia parado tem um custo elevado na carteira, na saúde e bem-estar das pessoas. Para o Estado não deveria ser diferente, porque o Estado somos todos nós. Cada dia em que uma obra pública dificulta o acesso a um comércio é um dia em que o Estado perde receita, já que a receita do Estado provém dos rendimentos das empresas e dos cidadãos. Se os 13 meses de obras no Toural foram fatídicos para muitos comércios, imaginem o prejuízo que será ter o centro das Taipas esventrado durante 2 anos!!

Os gestores públicos agem como se fossem donos e senhores do espaço público, quando não o são. O espaço público é de todos nós e deve responder às nossas necessidades, ao governo e às câmaras cabe a função de o gerir, e gerir pressupõe também calcular o valor do impacto que estas obras terão na qualidade de vida das pessoas, na economia dos pequenos comércios e no funcionamento das empresas, ponderando esse valor no custo final de uma obra. O preço de uma obra não está apenas nos materiais e mão de obra, mas também nos prejuízos que esta, pela sua duração, causa às pessoas e às empresas. Afinal é de interesse público que estamos a falar, e interesse público é o interesse das pessoas e das organizações que compõem a nossa comunidade.

Aristóteles dizia que a política serve para resolver os problemas às pessoas, infelizmente o que vemos, hoje em dia, é, a política a complicar-nos a vida, não só, mas também, no que a obras públicas diz respeito. E este comportamento tem o propósito de alimentar o servilismo que a nossa classe política tanto gosta. Caro leitor, em ano de eleições, convido-o a olhar para uma obra pública e fazer a reflexão: quanto tempo demorou a começar? Quanto tempo demorou a acabar? Que impacto teve no meu dia-a-dia? Era possível fazer melhor? Lembre-se que aplaudir um político por fazer uma obra pública é o mesmo que bater palmas a uma caixa de multibanco por lhe “dar” dinheiro.

 

Nota: artigo de opinião originalmente publicado na edição #03 do Jornal de Guimarães em Revista, a 18 de junho de 2021

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