O valor da vida
O quadro ético e, por conseguinte, axiológico ao qual respondemos, traduz - em sede de decisão política – boa parte do quadro jurídico-normativo pelo qual nos guiamos, enquanto comunidade, sobretudo quando falamos das democracias ocidentais, onde, o que lá se plasma resulta da formação de maiorias, sejam elas imbuídas da legitimidade representativa, ou por consulta direta.
Eu que, no essencial, aderi ao CDS por ser, à época, o único partido do espectro parlamentar que defendia a vida integral, não pretendo trazer à colação um “revisionismo” histórico sobre o tema que titula a opinião deste mês. Tão só, o facto de ele estar hoje de volta ao debate público. Três exemplos: nos Estados Unidos, no caso histórico de 1973 conhecido como “Roe vs. Wade”, em que foi decidido que as mulheres grávidas têm o direito constitucional de interromper a gravidez até ao ponto de viabilidade fetal e que agora o Supremo Tribunal daquele país quer, basicamente, anular.
Outros dois cá em Portugal. O da eutanásia, cujos avanços e recuos parecem querer levar a futura lei para um campo totalmente liberalizado, e um recente debate parlamentar na comissão de saúde, a propósito da avaliação dos médicos em que a administração propunha uma majoração aos clínicos que conseguissem evitar o ato clínico de interrupção da gravidez pelo reconhecimento de que traz impactos negativos à saúde da mulher, circunstância que foi entendida por alguns setores como uma violação do direito previsto.
Faço uma declaração de interesses, para além da que acima já desvelei: a minha vinculação espiritual é pró-defesa da vida. Contudo, sabendo da multiplicidade de que é composta a sociedade, admito um debate que - por dissecados argumentos já dirimidos no espaço público – possa ser feito noutros fóruns.
Então porquê chamar este tema de novo a um espaço como estes? Somente para vos confessar do conforto que me dá responder, nesta matéria (como noutras, aliás), a um escopo de princípios e valores que mantêm a coerência geral sem – como nos diz Sua Santidade Francisco – ter a veleidade de julgar.
Para um Cristão, não se ziguezagueia acerca do valor da vida em função da particularidade de o tema em questão ser o da guerra (perto ou longe da geografia de referência), o do início, ou o final da existência. Há particularismos que a comunidade política pode e deve atender para a resolução de casos concretos, mas, se mudarmos o farol ou o desligarmos dificilmente saberemos se o barco tem destino ou se as suas voltas e contravoltas se tratam, tão só, de um vago desfile estético curvilíneo que apontam ao interesse de ocasião, que mais não é que o “descarte” que é descrito na Exortação Apostólica “Amoris Laetitia”.
Fica então a questão: quanto vale uma vida?