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Igreja: Só na verdade viva e na justiça concreta nasce a reconciliação

Carlos Caneja Amorim
Opinião \ quinta-feira, março 09, 2023
© Direitos reservados
A Igreja não pode é silenciar tais condutas ignominiosas. Não há que ter medo das palavras: silenciar é ser cúmplice.

Face ao que já se sabe sobre os abusos cometidos sobre aqueles que a Igreja devia proteger, sem hesitações, como católico, sinto vergonha, como católico, peço perdão, como católico, exijo justiça para as vítimas e aplicação das justas penas aos culpados. E suspensão preventiva imediata de todos os suspeitos de tais atos hediondos e repugnantes. Aliás, sinto obrigação de não silenciar o desconforto absoluto com as últimas posições adotadas pela Conferência Episcopal Portuguesa, bem como pelo Cardeal-Patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, após a divulgação pública do relatório final da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais de Crianças na Igreja Católica Portuguesa.

Não é aceitável que, ao dia de hoje, não se perceba a gravidade da situação e a necessidade de se adotar medidas imediatas e preventivas, no respeito pelo princípio base defendido pelo Papa Francisco em 2019, defendendo a «tolerância zero» perante situações de abusos sexuais de crianças. Acresce constatar uma ostensiva perplexidade: a Comissão foi um grupo de trabalho independente constituído, precisamente, após um convite dirigido a Dr. Pedro Strecht, no final de 2021, por parte de D. José Ornelas, presidente da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) para realizar um estudo sobre práticas de abuso sexual de menores no seio da Igreja Católica Portuguesa, abrangendo o período entre 1950 e 2022. Todos concordamos e saudamos a decisão da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP) em encarar de frente o problema e avançar para um inquérito imparcial e competente sobre tais crimes hediondos. A Comissão iniciou os seus trabalhos em janeiro de 2022, com um núcleo central de profissionais de diferentes áreas, com indiscutível autoridade e reputação científica: Pedro Strecht, Ana Nunes de Almeida , Daniel SampaioÁlvaro Laborinho LúcioFilipa TavaresCatarina Vasconcelos. Para o estudo dos Arquivos da Igreja, foi convidado Francisco Azevedo Mendes, que constituiu autonomamente o Grupo de Investigação Histórica (GIH) com outros três investigadores: Júlia GarraioRita Almeida de Carvalho e Sérgio Ribeiro Pinto (historiadores). Ora, quando católicos e não católicos percebiam que a Igreja Católica estava, finalmente, a assumir as suas responsabilidades e a lutar contra esta chaga, eis quando surgem estas declarações infelizes e contraproducentes da Conferência Episcopal Portuguesa (CEP).

Foi um ato falhado que gerou desconforto generalizado e fez questionar qual era afinal a estratégia original de constituir a Comissão Independente. Para minha felicidade e de todos os católicos vimaranenses, do Minho veio a esperança: a nossa Arquidiocese de Braga, seja através do Arcebispo, D. José Cordeiro, seja do Bispo Auxiliar, D. Nuno Almeida, adotou uma política clara e objetiva: assumir a verdade dos abusos (veja-se, como exemplo, a reação imediata e direta ao caso de Joane), pedir perdão, e exigir justiça para as vítimas, não hesitando em aplicar medidas suspensivas imediatas aos identificados abusadores. Esta é a Igreja que eu defendo: sem medo, com coragem, defensora da verdade e da justiça, que assume os seus erros e denúncia sem hesitações os crimes praticados no seu seio, doa a quem doer. Perceba-se o elementar: Quem entrou na Igreja Católica para abusar de crianças nunca foi católico (no sentido de ter fé verdadeira e respeitar minimamente os valores do cristianismo), tenha ele ou ela a função que tiver: usou foi a Igreja para conseguir os seus intentos perversos e criminosos.

A Igreja não pode é silenciar tais condutas ignominiosas. Não há que ter medo das palavras: silenciar é ser cúmplice. Mais: silenciar potência novos abusos e novas vítimas. Importa perceber o seguinte: para as vítimas é irreversível, os danos são para sempre e insuscetíveis de adjetivação. Às vezes só numa lógica de vizinhança com as nossas vidas é que damos a importância devida; sim, todos reconhecemos a gravidade da situação, mas perguntamo-nos em voz alta: e se fosse um filho meu? E se fosse um irmão? Um sobrinho?.. Emociona-me pensar no sofrimento sem fim de cada vítima. Foi imperdoável ter acontecido uma vez. Façamos tudo para que não volte a acontecer. Só assim a Igreja católica será futuro.

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