Fale-se de imigração
A imigração é, como tantos temas do mundo de hoje, tabu. Falar de imigração passa para o patamar de racismo mais rapidamente do que se consegue explicar a um radical que a liberdade de expressão serve o que gosta de ouvir, mas também o que não gosta.
É por isso que se deve mesmo falar sobre imigração. Até porque a chegada do tema já tem pecado por tardia noutros lugares pela Europa fora, com consequências difíceis de reverter por esse atraso. Em Portugal, já são mais de um milhão de residentes estrangeiros (apenas os que sabemos que estão cá – legais), correspondem a 10% da população. Tiveram um crescimento de aproximadamente 58% entre 2020 e 2023, segundo dados da FFMS, correspondente a cerca de 380 mil novos imigrantes em três anos, recebidos num país com 10 milhões de habitantes. É difícil de acreditar na capacidade para responder a um crescimento tão acentuado sem que o mesmo resulte em falta de condições para que estas pessoas possam viver com dignidade. Um contexto desfavorável ao seu saudável acolhimento pela chegada desmedida e abrupta, que não educa nem suaviza a postura dos portugueses perante a mudança, que acaba por ser inorgânica por tão marcantes diferenças culturais. Um convite à criação de situações potencialmente problemáticas. Um país que é seguro até que deixe de o ser. E depois é tarde, tem sido para outros.
É por se ter tornado um tema tão sensível e evitável que sobra quase por inteiro para a exploração de extremistas. Por isso o mal-entendido com o Martim Moniz – bairro problemático onde já aconteceram operações semelhantes devido a queixas dos moradores relativamente à falta de segurança. Pela ansiedade política com que o Governo, desesperado pela conquista de eleitores recetivos ao discurso da extrema direita, protagonizou uma tentativa arrependida de reclamar créditos por uma operação policial que, para além de aparentar algum exagero numa atuação que não transmite segurança a ninguém, acabou por se revelar mais espalhafatosa do que eficiente. Um suposto combate a perceções com propagação de novas pela (extrema) esquerda política, que aproveitou a oportunidade para distribuir cravos e banalizar coisas sérias, sugerindo uma associação a práticas de regimes autoritários do passado, e condenando uma operação da qual os imigrantes que tentaram vitimizar não eram os visados.
A realidade é que a economia portuguesa precisa de mão de obra imigrante neste momento. Devido a problemas estruturais no mercado de trabalho, essa mão de obra barata permite ganhar tempo para se evitar uma correção agressiva e se poder agir no sentido de estimular politicamente uma gradual. Há profissões que não são valorizadas o suficiente ao nível salarial para atrair portugueses, e, sem os imigrantes, esse ajuste levaria a um consequente aumento de preços que poderiam provocar uma inflação generalizada.
Mas há outros desafios com a imigração – essa cedência envolve sacrifícios; riscos à identidade e cultura, e por isso deve ser equilibrada. O curto prazo pode-se colmatar dessa forma, mas o longo exige reformas e ajustes do mercado que a própria imigração em massa bloqueia. E é lógico que promova resultados favoráveis na Segurança Social – mais uma vez é um olhar sobre o curto prazo que constata a normalidade de que a primeira geração o faça sendo que os benefícios acontecem principalmente durante a reforma. Para ser analisado de forma séria, é necessário mais tempo. Nessa fase, quando o efeito positivo passar, sobrará a dependência da imigração que poderá representar a transformação do país como o conhecemos.
Um fluxo de imigração controlada é o que oferece mais garantias de estabilidade, no curto e no longo prazo.