Cidade-estado de Guimarães: uma visão geoestratégica
É público e notório proselitismo da minha parte defender que Guimarães deve mover-se rumo ao futuro assente em duas pedras angulares: em termos de política interna, o conceito de Concelho-Cidade; no plano de política externa, o conceito de Cidade-Estado.
Em boa verdade, cumpre a todos nós, como vimaranenses-cidadãos, isto é, “inscritos” e envolvidos nas causas perenes e “futurantes” da nossa terra, sermos pessoas do nosso tempo. Bernardo Soares, no Livro do Desassossego (Autobiografia – Diário), assumia-se como intérprete do seu tempo, o que, infelizmente, implicaria pagar o preço da incompreensão, da desafeição e das friezas alheias.
No mesmo sentido, o professor jubilado da Universidade Católica, o cónego Arnaldo de Pinho, a propósito de D. António Ferreira Gomes, o Bispo que em nome da dignidade e da esperança disse não a Salazar (por antinomia com o Cardeal Cerejeira) afiançou que "o bispo teve razão no tempo e não antes do tempo”. E pagou o citado preço de que falava o heterónimo de Fernando Pessoa, acrescento eu. Humilhações em catadupa são impostas a Guimarães vindas do Poder Central e os vimaranenses tardam em reagir ainda embalados pelas glórias passadas.
É tempo de estarmos à altura do nosso génio histórico fazendo acontecer hoje, sermos donos do nosso futuro, exigindo respeito pela nossa soberania a uma Poder Central abusivo porquanto injusto e arbitrário. Ao longo dos tempos, todos os governos falharam a Guimarães: o dia de dizer basta teria que chegar.
E chegou: como o futuro o documentará, com a ação da “Associação Cívica Vimaranense – Guimarães, a Nossa Causa Comum”, na qual tenho a responsabilidade de ser presidente da comissão instaladora. Acresce: se dúvidas houvesse sobre o imperativo categórico de Guimarães ter de agir, a pretérita semana foi um fresco riquíssimo desse registo antidemocrático do Terreiro do Paço:
- Há cinco anos atrás a sociedade civil vimaranense, numa lógica de mecenato, ofereceu ao nosso hospital um equipamento médico de última geração que custou mais de € 2.500,000,00 visando abrir um Centro de Hemodinâmica, isto, para termos a valência de emergência no caso de enfarte agudo do miocárdio. Quer a pretérita Ministra da Saúde, quer o Presidente da ARS Norte, quer o próprio Primeiro-Ministro vincularam-se publicamente com essa abertura. Na última quarta-feira fez-se uma alegada e festiva abertura sem a prometida valência de urgência e sem a inclusão na rede de referenciação e na Via Verde Coronária, onde se estaria habilitado para realizar angioplastias primárias em caso de enfartes agudo do miocárdio;
- Depois do Centro Cultural de Belém e da Casa da Música terem apoios do Orçamento de Estado todos os anos porquanto foram construídos aquando de Lisboa e Porto como Capitais Europeias da Cultura, o Ministro da Cultura, afirmou no último sábado, no Teatro Jordão, que a Plataforma das Artes e da Criatividade, construída aquando de Guimarães Capital Europeia da Cultura 2012, continuaria a não ter qualquer apoio financeiro. Na proximidade da insolência e da petulância, sem se deter, avançou a seguinte esdrúxula justificação: “Não podemos esperar que o Ministério responda a toda a necessidade”;
- Para cúmulo, nessa mesma intervenção pública, o senhor Ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, sinalizava que o Castelo de Guimarães, o Paço dos Duques e Museu Alberto Sampaio não transitam para a órbita concelhia, nem da CCDR-N, mas, sim, passam da DRC-N para a DGPC: o que significa que as receitas leoninas geradas em Guimarães continuarão a seguir para Lisboa e a financiar o Orçamento de Estado;
- Ficamos também a saber, na pretérita semana, que o prometido e calendarizado “Campus da Justiça” afinal terá de ficar para outro tempo, algures em nenhures;
- Foi também garantido que haverá para um dia destes uma reunião sobre o Alfa Pendular Guimarães-Lisboa, suspenso desde março de 2020 e que a CP e o Ministro das Infraestruturas garantem que vai ser reposto e devolvido a Guimarães um dia. Em pose séria, chegam a jurar que falta pouco.
Para os vimaranenses não há alternativa: sendo homens e mulheres do nosso tempo, com a pulsão afonsina de sempre, cumpre agir e acordar, inclusive, o Norte de Portugal. Cogente é concretizar uma visão geoestratégica que passa pela institucionalização da Euro Região com a Galiza (eixo urbano de Aveiro à Corunha, que abrange 6 milhões de pessoas). Teremos uma boa esperança matemática de sucesso, alavancada numa língua familiar, em vários aeroportos, portos marítimos, universidades, polígonos industriais, com economia relevante e com assinaláveis ganhos de escala, tudo com um sem fim de proximidades.
Perceba-se que não é sonho: esta Euro Região já está em esboço/ação e já se candidata a fundos comunitários conjuntos, representada pela CCDR-N e pela Junta da Galiza. Só assim seremos tidos em conta e respeitados pelo Terreiro do Paço, que temerá ver o Norte passar a ser a nova grande centralidade do país, já não precisando de mendigar.
Invertendo-se os papéis: quem passaria a desesperar por uma reunião e por uma chamada telefónica com o nosso Presidente da Câmara seria o Senhor Poder Central. Como seria interessante ter Guimarães (juntamente com Santiago de Compostela) como cocapital dessa Euro Região.