Câmaras podem arrendar “forçosamente” prédios devolutos? Sim!
São já antigas as pretensões do Governo, por um lado de aumentar a oferta no mercado de habitação, e por outro de combater a decadência e abandono de muitos imóveis devolutos, especialmente no centro das cidades. Esta e muitas outras vontades materializam a sua ação com a autorização legislativa do Decreto-Lei nº 89/2021, de 3 de novembro, um diploma que reforça várias medidas na Lei de Bases da Habitação.
Uma das mais importantes refere a possibilidade dos Municípios, no âmbito da classificação dos imóveis como devolutos, poderem apresentar proposta de arrendamento ao proprietário para posterior subarrendamento, quando o mesmo se situe em zona densamente populacional. Caso os proprietários não aceitem, e verificada a desocupação através de vistoria, a Câmara pode avançar com obras de reparação e recuperar a despesa tida com o arrendamento do imóvel.
O processo tem início com a delimitação, por parte dos Municípios, das chamadas Zonas de Pressão Urbanística – ZPU. Estas zonas classificam-se pela sua dificuldade significativa de acesso à habitação, quer seja pela escassez de habitação ou desequilíbrio entre a oferta e a procura, que levam a valores insuportáveis de acesso à habitação pela generalidade dos agregados familiares.
Uma vez demarcadas as ZPU, os Municípios procedem à identificação dos prédios que considerem como devolutos. A identificação faz-se pela verificação dos consumos mínimos ou inexistentes de eletricidade e água que permita constatar que o edifício não está a ser usado ou através de uma vistoria ao local. Segue-se uma notificação aos proprietários que poderão, querendo, exercer o seu direito de audiência prévia.
Decorre da Lei que todos os prédios urbanos, ou frações autónomas localizadas em ZPU, que se encontrem devolutos há mais de dois anos vejam aumentado o seu IMI até seis vezes e agravado, em cada ano seguinte, em mais 10%. A notificação da Câmara deve assim informar os proprietários da intenção do agravamento da taxa de IMI.
Sempre que o nível de conservação apurado na respetiva vistoria assim o indicar, pode o Município determinar a execução das obras necessárias à correção de más condições de segurança ou salubridade, bem como das condições de habitabilidade. Se o proprietário não assumir a condução das obras, ou nada disser, pode o Município avançar com “obras coercivas” no sentido de reabilitar o imóvel.
O ressarcimento das despesas pode ser feito de duas formas (e é aqui o que o Governo foi mais longe): o pagamento total das despesas ou o “arrendamento forçado” do imóvel, sendo que a receita será para pagar a dívida das obras
Para tal, o Município deve remeter ao proprietário proposta de arrendamento do imóvel para posterior subarrendamento. A aceitação, pelo proprietário, do arrendamento nos termos propostos pelo Município, constitui fundamento para a extinção do procedimento de classificação desse imóvel como devoluto e, por conseguinte, a retoma dos valores ordinários de IMI.
Para além disso, se o proprietário não manifestar por escrito o interesse em retomar a posse do imóvel, terminado o período de “arrendamento forçado”, a Câmara colocará o mesmo no mercado de arrendamento.
Esta Lei “passou ao lado” de muitos proprietários, que ainda hoje a desconhecem e que levou já a algumas surpresas com notificações a serem enviadas pelos Municípios. Guimarães ainda não tomou qualquer iniciativa nesse sentido, mas em breve deverá seguir o mesmo caminho que muitos outros Municípios.