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Multiusos de Guimarães: uma “mudança de paradigma” com 20 anos

Tiago Mendes Dias
Sociedade \ sexta-feira, novembro 12, 2021
© Direitos reservados
Trio de concertos no fim de semana assinala efeméride de uma infraestrutura “versátil”, que se constitui como “ativo estratégico” do território, diz o presidente da Tempo Livre, Amadeu Portilha.

O maior anfiteatro vimaranense para espetáculos (e a equipa que o sustenta) vai arfar quando chegar ao Natal e à passagem de 2021 para 2022; as quadras contêm os escassos dias em que vai parar em novembro e dezembro. “Depois da pandemia, estamos quase eufóricos, porque nunca tivemos um final de ano como este”, frisa Amadeu Portilha, presidente da Tempo Livre, a entidade que gere o Multiusos.

Os últimos cartuchos de 2021 incluem “Luccas Neto e a Escola de Aventureiros”, um musical vocacionado para as crianças, que vai atrair pelo menos 15 mil pessoas em quatro sessões, uma apresentação ao vivo do “Levanta-te e Ri”, a 26, o campeonato da Europa de TeamGym, um concerto de Natal com a presença de Aurea, o humorista Rui Sinel de Cordes, os Xutos & Pontapés nos seus 40 anos, e ainda uma produção de teatro e música de Tiago Simães. É o regresso à forma de um equipamento que viu 40 eventos serem adiados ou cancelados entre 2020 e 2021, devido ao novo coronavírus.

Para se completar o rol de espetáculos de final de ano, o próximo fim de semana reserva três concertos: António Zambujo nesta sexta-feira, Ana Moura no sábado e Nuno Ribeiro no domingo, todos a partir das 21h30.  São esses os nomes que sobem ao palco para assinalar o 20.º aniversário de uma infraestrutura que deve ser olhada como o “maior ativo estratégico” de Guimarães, defende o líder da régie-cooperativa que tutela o desporto, o lazer e o entretenimento no município. “O Multiusos de Guimarães é um dos maiores ativos estratégicos, senão o maior da nossa cidade. E se não é assim considerado, devia ser”, reitera.

Portilha argumenta que a economia local acelera quando o pavilhão tem “uma vida intensa em termos de concertos e de grandes eventos”, desde os “táxis de um lado para o outro” aos “restaurantes completamente cheios” e aos “hotéis lotados”. Até a “própria imagem da cidade no país e no mundo” beneficia, diz. “Com o Multiusos a funcionar bem todos os fins de semana, a hotelaria nunca teria problemas em Guimarães. Se fechar num fim de semana, é um prejuízo para a economia local. Temos de ter um grande evento todas as semanas”, vinca.

 

“Grande salto logo no primeiro ano”

Aquele prisma esverdeado anuncia a entrada na cidade para quem se desloca a partir da A7, da A11, de Pevidém ou Brito desde 17 de novembro de 2001. Nesse sábado, o primeiro-ministro de então, António Guterres, cortou as fitas do novo complexo municipal de piscinas e da nova arena vimaranense para entretenimento. O hoje secretário-geral da ONU sublinhou dois aspetos na sua intervenção: além de “exemplar no país”, a obra do Multiusos, fruto de um investimento à época de 6,3 milhões de euros, ilustrava a aposta em “cidades de dimensão intermédia”, para que pudessem ser a “coluna vertebral do país”, enquanto contrapesos a Lisboa e Porto.

À noite, a brasileira Gal Costa deu o primeiro concerto com Dori Caymmi, depois da abertura de Manuel d’Oliveira, guitarrista vimaranense. O trabalho para as condições apresentadas aos primeiros espetadores do Multiusos não se via, mas ele teve de ser feito até altas horas da madrugada anterior. Hoje na receção da infraestrutura, Dalila Sousa ainda se recorda da noite anterior ao espetáculo inaugural. “Não vim ao espetáculo, porque saímos daqui às 06h00 no dia do espetáculo. Estivemos a preparar tudo”, conta.

Contratada pela Tempo Livre em outubro de 2001 para o pavilhão da Escola EB 2 e 3 Gil Vicente, em Urgezes, a funcionária mudou-se para a equipa de manutenção e de limpeza do Multiusos em novembro e lembra-se do “estaleiro” que o interior daquele equipamento parecia a 24 horas da inauguração. “Na altura, estávamos à volta de umas 10 pessoas. Depois, veio uma empresa para finalizar”, diz. “Eu estava na parte de limpeza e de manutenção e aparecia tudo e mais alguma coisa. Tínhamos uma sala pronta a fechar e, afinal, faltava pôr lá um vidro ou um espelho”.

 

“O Multiusos foi uma espécie de pedrada no charco no norte do país, tanto é que, durante muitos anos, fomos a grande sala de espetáculos no Norte, sem qualquer margem para dúvida”, Amadeu Portilha, presidente da Tempo Livre

 

A verdade é que a protagonista de canções como “Chuva de Prata” ou “Um dia de domingo” lançou 20 anos com mais de 800 eventos e de três milhões de espetadores. Criado a propósito da Cidade Desportiva prometida pelo executivo de António Magalhães, para garantir “instalações de usufruto desportivo comunitário”, ao invés de limitar a política desportiva ao apoio aos clubes, o Multiusos preencheu um vazio quanto aos “grandes eventos” a Norte, ganhando dimensão nacional e internacional nos dois anos que se seguiram, diz o presidente da Tempo Livre

“O Multiusos dá o grande salto logo no primeiro ano. Em 2002, fizemos logo 53 eventos com um grupo de trabalho ainda a ser construído. Em 2004, tivemos um máximo de 266 mil espetadores, que teve muito a ver com o welcome park do Euro 2004, com concertos como os de Rádio Macau, Banda Eva, Santos & Pecadores, Delfins, Sérgio Godinho, Vitorino”, reitera Amadeu Portilha.

Com concertos como os de Bryan Adams e de Roberto Carlos, eventos desportivos como o Mundial de Andebol de 2003, o mundial de Enduro e uma apresentação de supercross freestyle que levou ao interior do espaço 400 camiões de terra, o Multiusos era ao fim dos primeiros cinco anos o segundo recinto para entretenimento no país, depois do Pavilhão Atlântico (hoje Altice Arena), em Lisboa. A infraestrutura vimaranense afirmava-se “versátil”, podendo acolher lotações entre as 500 e as 10 mil pessoas, segundo 12 configurações diferentes, frisa o responsável. E o facto de o pavilhão Rosa Mota, no Porto, estar então encerrado contribuiu igualmente para a rápida projeção do entretenimento em Guimarães.

“Havia um grande défice de equipamentos culturais para grandes espetáculos. Portanto, o Multiusos foi uma espécie de pedrada no charco no norte do país. Durante muitos anos, fomos a grande sala de espetáculos no Norte, sem qualquer margem para dúvida”, vinca o responsável.

 

Braga tem “mais lugares”. O Porto “outra centralidade”. Guimarães a “proximidade”

O panorama do entretenimento a Norte é bem diferente no final de 2021. O Multiusos está repleto de concorrência à volta: há a Super Bock Arena (antigo Rosa Mota), no Porto, inaugurado em 28 de outubro de 2019, o Altice Forum Braga, inaugurado em 11 de setembro de 2018, e ainda os multiusos de Gondomar, de Matosinhos e de Fafe, bem como o projetado Praça Viana, em construção. “Não tem muito sentido um país pequeno como o nosso ter tantos Multiusos numa área geográfica tão reduzida, mas é uma realidade e tenho de saber viver com ela. É uma realidade muito difícil. Temos uma competitividade muito grande. Vou perdendo alguns eventos e ganhando outros”, reconhece o líder da Tempo Livre.

Entre todos os espaços para eventos a Norte, Amadeu Portilha vê Braga, pela superior capacidade de lugares a pé (12 mil), e o Porto pela “centralidade” como os principais concorrentes. Para superar essas desvantagens competitivas, Guimarães valoriza o “sistema de bancadas versátil” e o trabalho no “acolhimento de espetadores e de produtores de espetáculos”, afirma Portilha. “A relação de proximidade com os produtores, de simpatia, de abertura permanente à resolução dos problemas é um fator distintivo do Multiusos”, especifica.

Nos espetáculos que decorrem em Creixomil, a Tempo Livre oferece assistentes de sala, controlo de segurança, acesso, limpeza, catering, serviço de bilhética e publicidade a quem aluga o espaço. Um dos funcionários responsáveis por alimentar essa engrenagem é Dalila Sousa, que descreve o “envolvimento com o público e os produtores” como o atributo mais gratificante de ali trabalhar.

“A nível de envolvência do público, tenho de direcionar as pessoas para os sítios corretos e dar resposta às questões que eles nos perguntam. A verdade é que cumpri aqui metade da minha vida e estou sempre a aprender O facto de ter passado na parte da manutenção e da limpeza ajuda-me a ir para todo o lado, porque conheço a casa melhor do que alguém que só estivesse estado na receção. Conheço os cantos todos ao pavilhão”, descreve a funcionária de 41 anos.

 

O futuro? Não perder a “identidade” nem a capacidade de se ser “atrevido”

Para o presidente da Tempo Livre, o Multiusos é um “pavilhão exemplar”, desenhado por uma equipa de arquitetos – do gabinete vimaranense Pitágoras – que foi “visionária” à época. “Passados 20 anos, a sala continua moderna e atual, com um piso base lavável que a, qualquer momento, é adaptado a novas funções. Não tem problemas a nível de balneários, de instalações de acolhimento, de condições sonoras, de condições de organização de espetáculo, de localização”, indica.

A única grande alteração necessária em duas décadas de funcionamento foi o investimento num sistema de pré-grelha que as infraestruturas concorrentes já tinham de origem e faltava ao Multiusos. “Permite-nos dar melhores condições aos produtores, no que diz respeito ao PA e à luz no espetáculo. Tínhamos de andar sempre a tirar placas e a meter placas no teto. Agora, com uma pequena plataforma elevatória, os produtores fazem toda a montagem de som e de luz de forma mais rápida e económica”, acrescenta.

Para o Multiusos se continuar a afirmar entre uma concorrência que fervilha, a receita de Amadeu Portilha para o que se segue assenta em dois ingredientes: “manter a identidade e a qualidade de serviço”, que são “fatores absolutamente distintivos” perante os concorrentes, e o atrevimento. “O Multiusos de Guimarães não pode perder a capacidade de ser atrevido", reitera. "Como digo aos meus funcionários, a palavra impossível já foi riscada há 20 anos, no dia em que abrimos portas. Nada é impossível aqui dentro. Tudo se consegue, tudo se faz”.  

Orgulhosa de pertencer à equipa do Multiusos, Dalila Sousa quer continuar ali “mais alguns anos” para ver aquela casa “evoluir”.

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