Guimarães Jazz recebe 5000 pessoas. E vê futuro como “construtor de pontes”
O som do 31.º Guimarães Jazz cessou, mas a Oficina, cooperativa responsável pelo Centro Cultural Vila Flor (CCVF), epicentro dos concertos, mas a sua “vitalidade” é certa; a noite de abertura, protagonizada pela voz de Diane Reeves, esgotou o Grande Auditório Francisca Abreu, e os 11 espetáculos que se lhe seguiram tiveram sempre ocupação superior a 70%, inclusive o de Linda Oh, em substituição de Archie Shepp, ausente por doença. Sem vendas “abaixo do que seria expectável”, o festival acolheu cinco milhares de espetadores.
“A afluência foi excelente. Tivemos cerca de 5.000 pessoas para todos os espetáculos, incluindo as jams e as oficinas. Mesmo tendo de cancelar o nosso segundo espetáculo e de o substituir, tivemos imensos espetadores que mantiveram o bilhete, o que denota grande confiança no trabalho do nosso diretor artístico, o Ivo Martins”, resume ao Jornal de Guimarães a diretora executiva da Oficina, Helena Pereira.
O programador cultural apercebeu-se igualmente que a cidade recebeu “muito mais público” face a 2020 e a 2021, anos marcados pela pandemia de covid-19, mas a cristalização do Guimarães Jazz numa dada forma de programar e apresentar música não é caminho.
Mesmo sem “receitas” formatadas para os anos que aí vêm, Ivo Martins defende que o festival tem de se “alterar e transformar” à medida que “as coisas do exterior” se transformam e dá um contorno do que pode ser o devir: “juntar pessoas aparentemente distantes que conseguem interagir entre si e fazer dessa junção uma nova realidade sonora”.
“O festival é um construtor de pontes entre pessoas distantes e tenta exponenciar novos espaços de expressão, novos sons, novas imagens. É este o nosso caminho. O festival deve trazer para dentro de si o maior número de pessoas das mais diversas gerações”, vinca o programador.
Essa orientação pressupõe “um espaço o mais aberto possível” a “todas as idades”, a “todas as formações” e “tendências” de “expressão artística”, passível de conversão num “momento interessante ou curioso que pode ultrapassar tudo o que fora pensado anteriormente”.
Se se olhar ao cartaz deste novembro, há concertos que se enquadram nesse guião. Ivo Martins realça dois: o do coletivo liderado pelo baterista Hamid Drake, a dar “um colorido muito mais interessante de expressões artísticas, visuais e sonoras” à obra de Alice Coltrane, graças, por exemplo, à dança e à spoken word de Ndoho Ange e à eletrónica de Jan Bang, a 12 de novembro, e aquele que reinterpretou Ibéria, trabalho do guitarrista vimaranense Manuel d’Oliveira, que atuou com os músicos espanhóis Jorge Pardo e Carles Benavent e a Orquestra de Guimarães, a 17 de novembro.
“O concerto do Manuel d’Oliveira foi interessantíssimo. Trabalhou muito bem o concerto com a Orquestra de Guimarães. Trabalhámos um conjunto de situações, de pessoas, de interesses, de formas de estar, e explorássemos coisas com as quais as pessoas não estariam muito a contar”, realça o diretor artístico.
O responsável elogiou ainda a reinterpretação de Jazz in the space age, obra seminal de George Russell, lançada em 1960, por nomes emergentes do jazz: os pianistas Ethan Iverson e David Virelles, na companhia da Orquestra de Jazz de Matosinhos, a fechar o cartaz.
Para o responsável, a vantagem de se “fazer pontes entre pessoas que eventualmente nunca se encontrariam” noutro contexto é a de apresentar coisas “de maneira diferente e muito mais apelativa”, a de fazer com que “os dois lados juntos sejam maiores do que quando separados”.
Victor Garcia noite fora: “Nunca vi um perfil parecido com o dele nas jams”
Referência do festival, as jam sessions regressaram ao café-concerto do CCVF, entre 10 e 12 de novembro, e ao Convívio, entre 17 e 19 de novembro, tendo corrido “muito bem”. “As jam sessions concorreram extremamente bem. Os músicos deram-se completamente ao trabalho. É preciso ter muita força e energia para aguentar todos estes dias a ensinar e a tocar”, descreve Ivo Martins.
Essa visão merece a concordância do presidente do Convívio, Carlos Jordão. Responsável pelo primeiro dos concertos no dia de encerramento do festival, o Victor Garcia Group teve ainda a seu cargo as oficinas de jazz e as jam sessions. E o “jazz latino-americano” do coletivo de Chicago, com “muito ritmo”, despertou “uma energia contagiante” no público que afluiu ao Convívio por três noites, descreve. “Como de costume, as jams estiveram completamente cheias, e as pessoas estavam sempre a querer ouvir”, vinca.
Os elogios de Carlos Jordão abarcam a “seriedade e profissionalismo” de um grupo com uma forma de estar que se destacou. “No sábado, passaram por lá quatro músicos do David Murray. O Victor Garcia foi extremamente profissional. Não fez a mesma jam entre o que tocou com os músicos do David Murray e, depois, com os jovens da ESMAE. Nunca mais saía do palco, a tocar com toda a gente. Foi excecional. Nunca vi um perfil parecido com o dele nas jams”, descreve.