As luzes que encantam um Natal que mudou de data
As iluminações de Natal em Guimarães começaram a brilhar ao som do tema Canto dos Sinos, um original ucraniano de 1936 que proliferou e se multiplicou em várias línguas. A escassos metros do Toural, aqueceu o coração de Kira Vasylenko, na Rua da Caldeiroa. Há sensivelmente dois anos em meio em Portugal, desde que a guerra alastrou pelo território ucraniano, a cabeleireira despertou para sonhos passados através dessa sonoridade que se ouve nas schedrivki, canções que se ouvem na Ucrânia a 14 de janeiro, com votos de riqueza e prosperidade. Por agora vimaranense, vive uma quadra natalícia que é um misto das culturas portuguesa e ucraniana. Há pontos que se tocam, outros nem tanto.
“Para nós é mais importante o Ano Novo do que propriamente o Natal. Aqui têm a figura do Pai Natal, lá temos a figura do Ded Moroz, o Avô do Frio, porque lá é muito frio nesta altura”, explica. A guerra que o seu país trava levou a que o calendário fosse alterado; em julho de 2023, o presidente Volodymyr Zelensky assinou a lei que adotou o calendário gregoriano como oficial na Ucrânia, em vez do juliano, utilizado na Rússia. A celebração do Natal mudou assim de 07 de janeiro para 25 de dezembro. Ainda assim, o dia 31 de dezembro já era importante. “Antes era o dia 13. Preparamos a árvore de Natal e reunimos a família para uma noite de divertimento e muito fogo de artifício. Agora há muitas alterações na Ucrânia: as pessoas têm de recolher até às 22h00 e não há fogo de artifício”, dá conta, sublinhando que também o abrir dos presentes, debaixo da árvore, é semelhante.
Entre as diferenças, salta à vista a iluminação citadina que prolifera nas várias cidades portuguesas. “Na Ucrânia, não temos muitas destas luzes. Em Kiev temos, mas em Kramatorsk não”, aponta, lembrando que esse não era um hábito da região fronteiriça de onde é natural, mais próxima da fronteira com a Rússia.
Ao falar em diferenças, rapidamente saltamos para a mesa. A filha, Maria Vasylenko confirma de imediato que “há, realmente, muitas diferenças” na gastronomia; apesar de estar em Portugal, vai mantendo o palato aconchegado pelos sabores da sua terra. Em Portugal, gosta sobretudo do pastel de nata. “O primeiro Natal que passei cá estive com pessoas portuguesas, para entender a cultura. Provei bacalhau, mas não gostei”, solta Kira, entre sorrisos. “Agora já vou comendo, habituei-me, gosto de pataniscas”, destaca.
Nas sobremesas, soam novos traços distintivos. “Aqui fazem muitas sobremesas, mas – desculpem-me – são todas à base de ovos. Na Ucrânia, muita gente é alérgica. Temos o bolo de Kiev, que é típico”, apresenta Kira. Outro dos doces principais é o kutya, feito de trigo ou arroz com mel, sementes de papoila, nozes e frutos secos. De relance, a cabeleireira traça a simbologia do Natal ucraniano: “É um momento de união familiar, preservação de costumes antigos, músicas tradicionais e uma atmosfera de alegria e celebração”. Na manhã do dia 07 de janeiro, agora 25 de dezembro, as famílias, maioritariamente cristãs ortodoxas, antes do banquete, entre outras tradições.